quarta-feira, 26 de março de 2008

Gentileza gera gentileza

Gentileza gera gentileza
Marcelo Rubens Paiva
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Decadência de valores. Deselegância. Mundo perdido, do avesso, olho por olho, seja o que Deus quiser, cada um por si. Três eventos na semana do carnaval me alertaram que o País vive uma crise moral na base do cidadão comum (o homem cordial).1) As vagas de estacionamento para deficientes do Shopping Frei Caneca estavam ocupadas. Elas são demarcadas (e mais largas), pois é preciso espaço para encaixar uma cadeira de rodas entre dois carros. Não por outra, elas existem. Perguntei aos seguranças se foram deficientes mesmo que saíram daqueles carros, que não traziam o símbolo internacional de acesso. ''''Dali saiu uma senhora que disse que era cancerígena (sic.) e que esqueceu as muletas em casa'''', respondeu. Não é preciso exagerar. Sair mancando surte um efeito mais autêntico.2) Subi para o terceiro andar, para assistir ao filme Onde Os Fracos Não Têm Vez, dos irmãos Coen, que debate a decadência dos valores morais. Manobrei a minha cadeira de rodas motorizada no único espaço para cadeirantes - a primeira fileira.O fim do filme corre. Surpreendentemente, morre um personagem essencial. ''''Para mim, acabou o filme'''', disse em voz alta o espectador atrás de mim, que passou a conversar com a namorada. Não acabara. Informações importantes para entender a trama apareciam. Fiz um ''''shhhh''''. Não um ''''shhhh'''' autoritário, impositivo. Foi um ''''shhhh'''' gente boa, colega de sessão de cinema, cúmplice por também não ter viajado no carnaval. O sujeito não parou. A conversa aumentou de tom. Então, eu disse na boa, didaticamente, nada arrogante: ''''Não acabou o filme ainda.'''' Ouvi o que jamais imaginei ouvir no cinema em que vou em média duas vezes por semana: ''''Vai tomar no ...''''Respirei fundo. Lembrei-me de que, no mesmo cinema, meses antes, testemunhei uma briga entre dois espectadores, que saíram na porrada provavelmente pelo mesmo motivo: conversa durante a sessão ou celular atendido. Interessante, pois a trama daquele filme prendia. A platéia se levantou, foi para as laterais, abriu espaço para os brigões e não desgrudou os olhos da tela. Deixou os caras e as suas respectivas controlarem a situação. Isso, sim, é que é filme bom!Porém, o final de Onde Os Fracos Não Têm Vez é fraco. Surgem novos personagens não se sabe de onde, as cenas se confundem. Só depois, em casa, entendi quem, afinal, ficou com o dinheiro. Descoberta colocada em xeque num papo de bar no dia seguinte.Imaginei sacar o braço da minha Quickie P200 e jogar na cara do sujeito. É um gesto que já treinei diante do espelho, como Robert De Niro: ''''Está falando comigo?'''' O braço pesa. Lembra uma Mini Uzi ou uma Cobray 9 mm, a submetralhadora que o ex-estudante de medicina Mateus da Costa Meira disparou em 1999 numa sala de cinema do MorumbiShopping e matou três pessoas.Eu poderia jogar o braço na cabeça dele, ou ameaçá-lo no escuro, como se eu estivesse mesmo armado. Eu poderia pegar o braço, virar a cadeira e dramaticamente anunciar, apontando a suposta 9 mm: ''''Mãos na cabeça, perdeu! O que você disse?! Repete! Pede pra sair!''''Eu poderia sair e chamar os seguranças. Ou fazer um escândalo, gritando mais alto, como um maluco, técnica que o meu amigo Otávio Muller usa para se dispersar em saídas tumultuadas.O sujeito bufava nas minhas costas. Ele queria uma resposta. Estava pronto para a réplica. Meu silêncio o torturava. Era isso. Sou um covarde. Numa cadeira de rodas, não encarei o grande guerreiro da Bela Vista.Vi o fim do filme sem me mexer. Acenderam as luzes. Ele passou por mim. Vestia um boné MC. Deu uma olhadela para trás. Naquele instante, eu poderia ligar minha cadeira torque com duas baterias de 24 volts, que sobe degraus de até 6'''' e atinge a velocidade máxima de 13 km/h, e atropelá-lo. Até quebrar a sua perna, como já quebrei a minha, numa curva de que errei a tangência.Como briga um cadeirante? Acredito que nosso ponto forte é enfiar o pé da cadeira na canela da vítima e, com os dois braços ao mesmo tempo, derrubá-la no sentido oposto, num gesto preciso. Que, confesso, nunca treinei diante do espelho. E torcer para a cavalaria chegar.Mas não fiz nada. Sim, Onde Os Fracos Não Têm Vez, prefiro a minha paz. Ele sorriu, cínico. Disse com os olhos: ''''Covarde, você é um covarde, e eu venci a grande batalha.'''' Me dei conta de que é preciso ser corajoso para não ceder a tentações e ignorar a loucura alheia. E me perguntei o que leva um sujeito num feriado a comprar briga com um lesionado medular C5-C6?Perguntei a alguns amigos não cadeirantes o que teriam feito. Todos disseram o mesmo, que teriam respondido: ''''Vai você.'''' Imaginei a seqüência do conflito, com o fim do filme rolando:''''Vai você.''''''''Não, vai você.''''''''Você quem vai.''''''''Vai você.''''''''Você primeiro.''''''''Você.''''''''Não, você!''''Você teria respondido?3) No dia seguinte, encostei o carro numa vaga na Oscar Freire. Saio do carro montado na minha Quickie P200 pela direita, onde há uma plataforma móvel. Se paro na faixa da esquerda, costumo acioná-la quando não tem carros passando, pois ''''aterrisso'''' no meio da faixa. Mas se algum carro aparece, costuma aguardar educadamente a operação.Não nesse dia. Um elegante Ford Fusion não esperou. Apesar do farol da esquina estar fechado. Passou a centímetros da minha cadeira. Dei um tapa na lataria do carro e disse algo como ''''não sabe esperar, mal-educado''''. Ele freou, me olhou furioso e disse: ''''Tem gente que merece estar onde está.'''' Foi a primeira vez em 27 anos de cadeirante que ouvi tal comentário. Ele caprichou e foi rápido. Eu não conseguiria atropelar a sua canela. Mas faria um bom estrago se sacasse o braço da cadeira e quebrasse seu vidro traseiro.Não joguei o braço da minha cadeira. Segui o meu caminho. A cordialidade brasileira propõe relações diretas. Não controlam o que dizem, e não importam as conseqüência dos seus atos. O jeito é lamentar. Até porque alguém pode filmar tudo e colocar no YouTube. Indico até o título: ''''Cadeirante maluco perde controle!''''
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terça-feira, 25 de março de 2008

SINTO VERGONHA DE MIM

Sinto Vergonha de Mim
Sinto vergonha de mim por ter sido educador de parte desse povo, por ter batalhado sempre pela justiça, por compactuar com a honestidade, por primar pela verdade e por ver este povo já chamado varonil enveredar pelo caminho da desonra. Sinto vergonha de mim por ter feito parte de uma era que lutou pela democracia, pela liberdade de ser e ter que entregar aos meus filhos, simples e abominavelmente, a derrota das virtudes pelos vícios, a ausência da sensatez no julgamento da verdade, a negligência com a família, célula-mater da sociedade, a demasiada preocupação com o “eu” feliz a qualquer custo, buscando a tal “felicidade” em caminhos eivados de desrespeito para com o seu próximo. Tenho vergonha de mim pela passividade em ouvir, sem despejar meu verbo, a tantas desculpas ditadas pelo orgulho e vaidade, a tanta falta de humildade para reconhecer um erro cometido, a tantos “floreios” para justificar atos criminosos, a tanta relutância em esquecer a antiga posição de sempre “contestar”, voltar atrás e mudar o futuro. Tenho vergonha de mim pois faço parte de um povo que não reconheço, enveredando por caminhos que não quero percorrer…Tenho vergonha da minha impotência, da minha falta de garra, das minhas desilusões e do meu cansaço. Não tenho para onde ir pois amo este meu chão, vibro ao ouvir meu Hino e jamais usei a minha Bandeira para enxugar o meu suor ou enrolar meu corpo na pecaminosa manifestação de nacionalidade.Ao lado da vergonha de mim, tenho tanta pena de ti, povo brasileiro! “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus; o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”.
Rui Barbosa

jornalisatas burros

Coisinha que peguei no BD no tópico Textos - E-mails - Imagens do Baboseiras: PS: são jornalistas portugueses Jornalista da RTP: É trágico! Está a arder uma vasta área de pinhal de eucaliptos! (trata-se de uma nova variedade de árvores...) Um jornalista da TVI: "As chamas estavam a arder". (fantástico!!!) Rodapé do Telejornal da Sic: O assassino matou 30 mortos. (era para ter a certeza que estavam bem mortos...) Jornalista da TVI: Foi assassinado, mas não se sabe se está morto. (e para se ter a certeza nada melhor que pedir ajuda ao assassino que matou 30 mortos!) Uma jornalista da TVI: "Estão zero graus negativos." (ok) Comentário de uma jornalista sobre o caso Aquaparque: "Os aquaparques têm feito, durante este ano, muitas vítimas, que o digam os dois mortos registrados este mês...". (direto do além!) Lídia Moreno - Rádio voz de Arganil: Quatro hectares de trigo foram queimadas...Em princípio trata-se de um incêndio. (em princípio, pois até se pode tratar duma inundação...) A meio de um relato de futebol: "Chega agora a informação...o jogador que há pouco saiu lesionado foi vítima de uma fratura craniana no joelho." (mais um caso raro na medicina!!!) Numa notícia do jornal da noite, Manuela Moura Guedes ao dar uma notícia diz que "um morreu e outro está morto". (sem comentários...)
1.. É dando que . . . se engravida. 2.. Quem ri por último . . . é retardado. 3.. Quem ama o feio . . . é cego. 4.. Quem não arrisca . . . é porque não tem caneta. 5.. O pior cego é aquele que . . . não anda de bengala. 6.. Alegria de pobre é . . . impossível. 7.. Quem com ferro fere . . . não sabe como dói. 8.. Sol e chuva, . . . vou sair de guarda-chuva. 9.. Em casa de ferreiro . . . só tem ferro. 10.. Quem tudo quer, . . . é muito mimado. 11.. Quem tem boca vai . . . ao dentista. 12.. Gato escaldado . . . morre. 13.. Quem espera, sempre . . . cansa. 14.. Os ultimos serão . . . desclassificados. 15.. Quem não tem cão . . . não caça. 16.. Há males que vem para . . . pior mesmo. 17.. Água mole em pedra dura tanto bate . . . que acaba a água. 18.. Se Maomé não vai à montanha, então . . . vai a praia. 19.. Quem dá aos pobres, . . .paga o motel 20.. Depois da tempestade vem . . . a gripe. 21.. Quem vê cara . . .ainda não olhou o resto. 22.. Devagar . . . nunca se chega. 23.. Antes tarde do que . . . agora. 24.. Boca fechada . . . não fala. 25.. Aguas passadas . . . já passaram. 26.. Em terra de cego quem tem um olho é . . . caolho. 27.. Quem cedo madruga . . . fica com sono o dia inteiro. 28.. Jacare não entrou no céu . . .porque não foi convidado. 29.. Assim como são as pessoas . . .são as criaturas. 30.. Em rio que tem piranha, jacaré . . . tem que ter camisinha
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CRÔNICA DA MULHER QUE BEBE E TIRA A ROUPA

CRÔNICA DA MULHER QUE BEBE E TIRA A ROUPA

Quem não tem na família ou no grupo de amigos uma mulher que bebe e tira a roupa atire o primeiro sutiã neste cronista.
É um clássico.
É uma das cenas mais lindas e chapantes da admirável e nada bucólica paisagem humana.
Porque não é nada simples, amigos.
Não é safadeza propriamente dita, não é aparecimento, não é um ato contra a moral e os bons costumes.
É o grau zero e máximo da beleza, meu caro Jommard Muniz de Brito.
Está mais para o sagrado, mas isso também é pouco, não explica direito.
É bonito, pronto, nada decifra, me devore como uma loba em pele de gata em teto de zinco quente.
É como se batesse um miserável calorzão da existência a pedisse o mais natural dos gestos de uma fêmea.
É como uma índia a caminho do afluente amazônico mais próximo.
Como Iracema a se banhar na gruta de Ubajara para refrescar-se e pensar um pouquinho na vida. Pense na falta de preocupação naquele tempo! Nem pensava que no futuro ia dar tanta dor de cabeça aos jovens nas questões vestibulandas alencarinas. “Me erra, não me interpreta”, cismaria a bela índia.
É agora, uma mulher que bebeu mais uma dose vai tirar a roupa. Porque a gente pressente, a terra gira mais avexada, o olho prescreve o belo episódio, blow up, depois daquele strip. Momento sublime movido a fome de viver e álcool.
E quando sobe na mesa é mais lindo ainda.
E a cara do marido tentando apagar aquele incêndio iluminado?
Um Deus nos acuda.
Quando a mulher tem filhos, só se ouve o sussurro do menino agoniado do juízo, no meio do burburinho, da confusão, do banzé: “Mãe é doida mesmo!”
Porque ver a mãe pelada no meio da festa dura para o resto da vida. Não tem divã nem macumba que curem mais o juízo. Mais mil anos de análise, como diz meu amigo Adão Iturrusgarai, agora habitante dos Buenos Aires.
Para quem não é filho ou marido é quase invisível, de tão sagrado, o corpo de uma mulher que tira a roupa na frente do mundo todo e de todo mundo.
E normalmente a mulher que tira a roupa é uma pudica, veste-se mais comportada do que Maria Antonieta.
É um longo e demorado strip-tease. Se brincar ainda usa combinações, anáguas,
Só sei que é lindo demais o tresloucado gesto. Tenho uma amiga que é duas cachaças, com umbu ou caju de tira-gosto, e uma peça de roupa que avoa longe lá no bar do Sargento do Pátio de São Pedro.
Os cafuçus ficam só na botica, na espreita, na tocaia grande, pense, meu caro Rodin, pense!
Melhor ainda é a mulher que tira a roupa cantando uma música cafona, como as lobas, deusas e ninfetas do livro de Thiago de Góes. “Esta noite, eu vou fazer de conta que sou livre. Eu vou viver a vida que ele vive, e depois eu posso até morrer”, canta a desalmada, um clássico de Diana, a mitológica.
Como é lindo uma mulher que bebe e tira a roupa em público, noves fora qualquer moralismo, como é lindo, e priu, e pronto!

entrevista diogo mainardi

BRASIL Você foi um dos três jornalistas brasileiros, além de Reinaldo Azevedo e Olavo de Carvalho, que desde a eleição de 2002 fez oposição aos modus operandi do PT e do presidente Lula. É destino, sina ou maldição? Eu nunca fiz uma crítica ideológica ao governo. O governo não é ideológico; o Lula, sobretudo, não é ideológico. Eu sempre o tratei como o laranja de uma gangue, como o testa-de-ferro de uma bandalha. A única novidade desse governo é que ele criou um escudo muito forte para acobertar a roubalheira, que é a imagem do próprio Lula. Ergueu-se uma cortina atrás da qual o roubo corre solto. Eu sempre pensei em abrir essa cortina, em minar o testa-de-ferro, em revelar o esquema laranja escondido atrás do Lula. O meu trabalho, desde o começo, foi desmontar o mito Lula. Eu só via nele uma fachada para encobrir interesses muito menores. Se o Lula é o testa de ferro, quem é que manda no governo? Lula se insere na velha tradição do caudilhismo. Um grupo de pessoas que veio da camada mais baixa da sociedade toma o poder e só pensa em se dar bem. É um grupo bastante grande e que está disposto a tudo. Aconteceu no Brasil e na América Latina muitas outras vezes no passado, e está acontecendo de novo agora. Com o discurso de combater a oligarquia, se forma uma cleptocracia. Esse grupo que está por trás do Lula é ideológico? Eles usam a ideologia quando lhes convêm; quando serve para arrebanhar inocentes úteis; quando serve para criar uma cortina de fumaça que os proteja ou quando a ideologia ensina um método de ocupação do poder. Mas o fim é apenas mercantil. Eles estão interessados em dinheiro, em poder, em se perpetuar no poder. Alkmin não ganhou porque era uma péssima alternativa ou errou na campanha? Alckmin era um péssimo candidato, o PSDB é um péssimo partido, e a gente não tem uma oposição de verdade no Brasil. A oposição fez um papelão durante um ano e meio nas investigações da roubalheira petista. Como a gente sempre conviveu com roubalheira, eu tentei lembrar que a roubalheira petista era pior do que as outras porque tinha um intuito golpista, como no caso do mensalão pago a parlamentares para apoiar o governo. Isso pode ter ocorrido no passado para comprar um ou dois projetos de lei, mas não para uma legislatura inteira. Uma compra desse nível nunca houve na história brasileira. O dossiê é outro caso de subversão da alternância, da democracia, financiada com dinheiro sujo. Toda a roubalheira petista tem um fundamento antidemocrático. Isso foi o que sempre me preocupou. Como você imagina o Brasil com mais quatro anos de governo Lula? Há um abatimento muito grande. A economia vai continuar em marcha lenta. Na parte dos direitos democráticos, vejo uma ameaça permanente, inclusive contra a liberdade de imprensa. Mas Lula só vai se “chavizar”, só vai transformar o governo em algo mais bolivariano, se a economia despencar ou se a imagem pessoal dele for para o brejo. Sempre achei que o maior perigo do Lula era que ele estaria disposto a fazer qualquer coisa para não perder as benesses do poder. Ele seria capaz até de fechar o Parlamento ou de confiscar a propriedade dos meios de comunicação. Se ele não tiver que fazer nada disso, vai continuar o governante paternalista, assistencialista, que a gente viu até hoje. Mas se a situação económica internacional piorar, temo que ele possa cometer mais algum despropósito antidemocrático. AMÉRICA DO SUL Quais são os pontos de identificação que você enxerga entre Lula, Chávez e Morales? Eles são parte de uma mesma coisa, fruto do mesmo germe. A definição de caudilhismo se aplica a todos eles. Eles são uma expressão do passado e imaginam um tipo de sociedade atrasada. A afirmação desse tipo de liderança vai levar a mais subdesenvolvimento. No passado, os caudilhos foram sucedidos por ditaduras militares. A gente espera que isso não aconteça mais uma vez. Também não há componente ideológico em Chávez e Morales? Também não. Chávez tentou dar um golpe, fracassou, foi eleito, deu um golpe branco depois de ser eleito, tomou conta dos meios de comunicação. Eles todos são apenas uns oportunistas que se aproveitam desse discurso de combater as oligarquias. Você acha que essa malta tem peso para ditar os rumos políticos da América Latina? Claro que sim. Ditar o rumo da tragédia é fácil. Você não precisa ser um grande estadista para levar um país à ruína. Eles estão sendo acompanhados rapidamente por um monte de gente na Nicarágua, no Equador. O México se livrou por pouquíssimo. Não são mais fenômenos isolados. Eles são a maioria na região. PORTUGAL Governante português, sempre que vem ao Brasil, leva consigo uma grande embaixada, mas a idéia que os portugueses têm é que os brasileiros não dão a mesma atenção às relações com Portugal. Qual sua opinião sobre a relação do Brasil com Portugal? Aqui, o cargo diplomático é um favor político, uma concessão política, e Portugal é o destino dos piores políticos, dos mais ignorantes - os monoglotas. Eles são mandados para Portugal porque é o único país onde se fazem compreender. É assim que funciona: o presidente pega um idiota malandro ligado ao governo e manda para Portugal como prêmio. Isso significa que o governo não dá a menor pelota para país de Eça? Não dá a menor pelota para lugar nenhum. A carreira diplomática no Brasil é politizada. O Brasil está cheio de bons diplomatas, mas que não fazem carreira. Quem é mandado para as principais embaixadas, como Portugal, em geral, é político de terceira categoria. Ainda persiste entre os brasileiros o estereótipo de Portugal como o lugar com mulher com bigode? Brasileiro não tem o menor interesse pelo que acontece fora do Brasil. Na verdade, não se interessa nem pelo que acontece nos Estados Unidos. Portugal não é notícia no Brasil porque é um país que se acertou. Bem ou mal, Portugal se transformou num país, algo que a gente nunca conseguiu fazer. No caso dos Estados Unidos, compreende-se que o americano médio não dê a menor importância para o resto do mundo por viverem numa potência mundial. No caso do Brasil, como se explica esse alheamento? O mundo é complexo, precisa lembrar o nome de muita gente, o nome da capital, da moeda… Quando o assunto começa a ficar muito complicado, a gente perde o interesse, olha para o lado, assovia. Brasileiro não é capaz de tanta concentração. O que acha da frase de Eça de Queiroz de que o brasileiro era o português dilatado pelo calor -livre de preconceitos, aberto e livre? Eça tinha opiniões muito pertinentes sobre o Brasil. Ele entendeu muito bem o país. Tudo o que ele dizia de mal a nosso respeito é verdadeiro. O Eça é um grande exemplo de intelectual antinacionalista. Ele falava mal não só do Brasil, mas também de Portugal, de maneira muito ácida, muito bem humorada. A única atitude decente que um intelectual pode tomar é odiar a própria pátria. Mas, ao contrário do que disse o Eça, o brasileiro não é o português dilatado pelo calor; é o português murcho, desidratado pelo calor. Há um chavão aqui no Brasil, e que já chegou a Portugal, de que se tivéssemos sido colonizados pelos britânicos e não pelos portugueses, Brasil seria hoje um país muito mais desenvolvido. Num exercício de achismo, você consegue conceber como seria nossa situação hoje? Não sei se o Brasil seria melhor, mas também não seria pior, porque pior do que isso não dá. Possivelmente o Brasil seria melhor até mesmo se tivesse sido colonizado por Uganda. O que herdamos de pior de Portugal? A gente estava falando de corporativismo, de covardia intelectual, de bacharelismo: esse excesso de cerimônia no embate de idéias é uma herança de Portugal. Algumas polêmicas histéricas aconteceram lá como aqui, mas o enfrentamento intelectual é, normalmente, muito domesticado, muito comportado. MUNDO Como avalia a ação dos americanos no Iraque? Houve uma sucessão de erros. Se há uma desculpa para os americanos é que erraram muito também no Afeganistão, onde fizeram uma guerra com apoio internacional, da ONU e de um monte de países desenvolvidos, e a situação também não está boa. O que há de errado é a idéia de que uma guerra ou uma ocupação pode ser resolvida em dois, três, quatro ou cinco anos, e que haja uma geração espontânea de civilidade. Isso não existe. E foi uma idéia mal vendida. Você acha possível essa idéia dos americanos de implantar em países orientais uma democracia nos moldes ocidentais? É possível implantar um sistema mais tolerante do que havia. No caso do Afeganistão e do Iraque, é muito melhor tentar implantar um governo mais aberto do que permitir que se mantenham ditaduras. No Iraque, hoje, existe uma espécie de imprensa livre, a tolerância a partidos políticos, a liberdade religiosa, coisas que não existiam e que com o tempo tendem a se enraizar. O Brasil, por exemplo, está numa transição democrática há mais de 20 anos e as instituições, às vezes, cambaleiam. Não é que seja uma coisa simples de se programar e de se implantar. O processo é lento mesmo. É curioso que a imagem que nos é passada pela imprensa é que nada no Iraque melhorou, a pior imagem possível… É, é. Porque, obviamente, há uma urgência na questão de segurança. É como no Brasil, há uma urgência na área de segurança pública. No caso do Iraque, a segurança é o ponto número um e tem de ser resolvido. Falar em liberdade quando não se pode sair na rua sem o risco de ser explodido por um carro-bomba é até piada. Mas os carros-bomba vão deixar de explodir quando eles conseguirem organizar um estado representativo, não só eleitoralmente, porque isso eles já têm, mas também economicamente. Você acha que o prolongamento da guerra e a idéia de que os Estados Unidos falharam seriam capazes de dar aos terroristas a impressão de que os americanos não têm força para derrotá-los? Os terroristas se sentiriam mais fortes se, depois de 2001, os Estados Unidos não tivessem feito nada. Ali eles teriam ganho a batalha. Se depois de tudo o que fizeram não houvesse uma resposta americana, aí sim eles se sentiriam vitoriosos. Até mesmo se os Estados Unidos se limitassem a uma retaliação no Afeganistão. Acho que o Iraque virou um campo de enfrentamento entre os Estados Unidos − em teoria, o Ocidente deveria estar do lado dos americanos e não está − e o terrorismo islâmico. George W. Bush é a besta que a maioria acha? Ele é um trapalhão. Um trapalhão que, nos momentos importantes, tomou as decisões certas, mas foi péssimo na hora de executá-las. A imigração descontrolada de muçulmanos para os Estados Unidos e Europa se revelou um tremendo tiro no pé do Ocidente. A partir disso se estabeleceu uma discussão sobre uma suposta guerra entre Oriente e Ocidente. Isso está certo? Não existe guerra. Não se pode falar em guerra. O que há é o terrorismo, que é um fenômeno para o qual a gente não encontrou uma resposta ainda. Transformar o Ocidente num estado policial é uma hipótese inviável. Agora, é óbvio que a gente tem que reprimir o terrorismo. A repressão tem que ir até o ponto em que não esmague o estado de liberdades civis. E esse é o ponto que a gente não conhece até agora. China, Cuba, Coréia do Norte, até quando vão durar esses regimes socialistas ditatoriais? Até a morte desses tiranos. Esses regimes se sustentam pela figura dos tiranos. Depois que eles morrerem, é muito provável que os regimes desmoronem entropicamente. A gente tem que torcer para que essa gente morra logo. Se pudéssemos acelerar a morte deles, seria ótimo. Você viu o filme feito pelo ex-vice-presidente americano Al Gore? Assim, você acha que o ambientalismo se transformou numa espécie de causa messiânica de gente da esquerda ou de gente séria com boas intenções? Não, não vi o filme. Não vou ao cinema há uns 10 anos. Ambientalismo é uma questão que tem que ser resolvida pelo mercado, pelas fábricas de automóveis e pelas empresas de energia. Acredito no mercado, acredito em competição. Acho que quando a gente tiver uma necessidade econômica de encontrar uma alternativa aos combustíveis fósseis, poluentes, a gente vai ter mais chances de encontrar. CULTURA Você explicou porque começou a escrever sobre política. A pergunta é: você pretende voltar a escrever sobre cultura? Serei obrigado. Eu não tenho muito interesse pelo que está acontecendo no mundo da cultura. Não há nada de muito excitante que atraia minha atenção, mas por pura falta de assunto vou acabar caindo em cultura de novo. Vai ser só por desespero, porque, se fosse por escolha própria, eu não voltaria. Entusiasmo pelo tema eu não tenho. E não tenho já há algum tempo. Quais escritores brasileiros você recomendaria leitura? Os de sempre: Machado de Assis, Lima Barreto. Quem mais? Deve haver o terceiro. Procurando um pouco até poderíamos encontrar. E os vivos, quais valem a pena? Compartilho o entusiasmo do João Pereira Coutinho pelo Millôr Fernandes. Ele tem um texto rápido, direto. Os bons escritores brasileiros são os mais econômicos: Millôr, Dalton Trevisan, Ivan Lessa - aqueles que conseguem enxugar nossa língua. Quais seus escritores portugueses preferidos? Li toda a obra do Eça, li toda a obra do Camilo Castelo Branco. Gostei muitíssimo das crônicas do João Pereira Coutinho. Ele é muito bom. Fico contente que o Brasil tenha comprado o passe dele. Hoje é mais fácil ou mais difícil ser Diogo Mainardi? Eu sempre tive uma visão bastante crítica a meu respeito, então nunca dei muita bola para minha imagem. Sempre me achei pior do que os outros achavam. Sei que o que eu faço é um trabalho, não é uma cruzada. Eu não tenho segundas intenções, não tenho motivação política, interesse pessoal. Faço porque é o meu trabalho. É muito fácil ser Diogo Mainardi porque acabo de trabalhar, desligo computador e sou esse aborrecidíssimo pai de família, um burguesinho comportadinho, certinho, meio barrigudinho que leva o filho para a escola, traz o filho da escola. Então é muito fácil ser Diogo Mainardi. Não recomendo a ninguém, aliás.

MOCÓ DE HOMEM SOLTEIRO

MOCÓ DE HOMEM SOLTEIRO
Noves fora o “homem de predinho antigo”, aquela criatura que adora um pé-direito alto, um sofá de época e uma luz indireta, o macho solteiro é um desastre no capítulo decoração. Tem lá o seu sofá velho, a sua tv, uma cama barulhenta, três ou quatro panelas _sem cabo_ encarvoadas pelo tempo, e copos de requeijão, muitos copos de requeijão, alguns deles ainda com um pedaço do papel do rótulo. Se brincar, o cara coleciona também os velhos copos de geléia de mocotó, um primor de utensílio vintage.
E quando a fofa, toda fina e fresca, nova costela, chega lá no muquifo com a sua garrafa de champanhe?! Procura, procura as taças, para fazer uma graça com o seu mancebo... e nada. O jeito é beber Veuve Cliquot em copo de extrato de tomate. Quem mandou apaixonar-se por um macho-jurubeba autêntico, que vem a ser justamente o avesso do metrossexual, aquele mancebo da moda que se lambuza de creminhos da Lancôme e decora o loft, sim, ele mora num loft, de acordo com as tendências da revista Wallpaper.
Pior é quando ela tenta mudar tudo. E põe aquele quadro caríssimo –artista contemporâneo, tendêeencia!- numa sala que não tem nem mesmo um sofá que preste?!
Um desastre.
A fofa, toda metida a besta, não desiste nunca. Ai presenteia o bofe _sim, ela está doida e perdidinha_ com uma batedeira prateada ultramoderna com 600 funções, que nunca será usada. Ai fica aquela batedeira high-tech fazendo companhia aos três pratos chinfrins e aos garfos tortos _como se o Uri Geller, aquele parapsicólogo que aparecia no Fantástico das antigas, tivesse jantado por lá ou feito faxina na área.
Ela começa a revirar geral, um deus-nos-acuda, numa casa onde ninguém havia mudado sequer uma planta de lugar. O reino vegetal, aliás, é outro ponto fraco do macho solteiro. Jarros, flores? Nem de plástico.
Na casa do homem solteiro típico, a utilidade triunfa sobre a estética. O cúmulo do utilitarismo. Sofá da tia-avó vira cama, como diz a minha amiga D., co-autora dessa crônica. A cama vira sofá, a rede vira sofá e cobertor, o cobertor vira cortina preso à persiana...
A falta de cortina é outra marca registrada do desmantelo do cavaleiro solitário. Quando muito, papel filme.
Abajur? De jeito maneira. Tosco no último, ele não tem cultura de luz indireta, nem nunca terá, esqueça.
Outro traço de personalidade do macho solteiro: tudo que chega até a cozinha vira tupperware _aquelas embalagens plásticas de lasanha comprada pronta, caixinha de entrega de comida chinesa ou japonesa, potes de sorvete...
Melhor assim do que as frescuras do ex da minha amiga D., a mesma rapariga acima citada. Ela entrou na casa dele e logo ouviu a advertência, em altos brados: “Não pisa de salto no meu carpete de madeira!”
“Nooooosssssa!,” arreganharia a bocarra o velho Costinha, se vivo fosse.
FONTE: XICO SÁ